Um esforço de poesia

Ontem no meu consultório comecei um grupo de pesquisa e leitura sobre Lituraterra, psicanálise e literatura. Antes, porém, pensei muito sobre o que me levaria aos sábados de manhã a pensar sobre psicanálise e literatura, sobre a escrita, a leitura, sobre Lituraterra, quando tudo parece tão medonhamente assombroso. Olho para o meu filho e me preocupo com o porvir. Que fazer?
Lituraterra, no entanto, me comove. Me co-move {foi uma reunião tão linda, com pessoas tão legais, com intervenções tão bonitas}. Então, pensei, se, como Lacan diz, decisivo é o litoral, é por aí mesmo que terei que caminhar. Nesse lugar heterogêneo esvaziado de uma matéria própria, co-habitado por mais de um mundo, mundos impróprios.
Certa feita ouvi um psicanalista batuta dizer que todo ideal tem um fundo homicida. Nesses últimos dias essa frase não me sai da cabeça. Nem sei se se tratam de ideais o que rola por aí, ou se são apenas adesões enlouquecidas movidas pela segregação – a marca de nosso tempo. Mas, por essa frase me tocar tanto nesse momento em que se quer tudo homogêneo e uniforme, que se tenta matar toda e qualquer diferença, trabalhar psicanálise e literatura nunca me pareceu tão apropriado: ambas são experiência que nos afastam dos ideais consistentes, que colocam o olhar em perspectiva, e que não têm, absolutamente, nem uma nem outra, qualquer aspecto salvacionista. O litoral não é um meio do caminho, um meio-termo, não é uma neutralidade política, ou uma justa medida, ou uma inação. Desde o litoral inventamos lugares e posições permanentemente. Inventamos outros modos de viver a vida. O que agora se faz tão urgente. Diante de um futuro que se desenha entristecido: a poesia e a psicanálise. Para não sucumbir aos abismos que aparecerem, para não sucumbir aos salvadores. Para re-existir.